29.9.09

Rondon: Diário de Campo 1 - Os Ticunas

por Renata Mielli, de Tabatinga/AM

Depois de seminários, solenidades e treinamentos, chegou a hora de ir a campo fazer o primeiro contato com as comunidades que serão, nos próximos 10 dias, o foco das atenções dos rondonistas. Não sem antes de uma última preparação: uma conversa com o prefeito da cidade, Joel da Silva. Ele fez uma breve apresentação dos principais problemas do município e respondeu várias perguntas dos rondonistas. As mais graves deficiências apontadas foram a precariedade do saneamento básico, a saúde e a falta de tratamento de lixo.

“Boa parte das comunidades vivem em igarapés e alagados, as que vivem na selva são aglomerados de 8, 10 famílias que estão alheias à cidade grande, nem têm conhecimento que nós existimos. Mas não são miseráveis, eles sabem extrair o alimento da água, da selva”, explicou o prefeito, apresentando aos rondonistas um novo modo de vida, que não se enquadra na sociedade de consumo que estrutura as grandes cidades do país.

A principal etnia indígena da região são os Ticunas, que precisam de apoio para ter sua produção artesanal valorizada. Logo após a conversa com o prefeito, os rondonistas foram visitar a aldeia Ticuna de Umariaçu II, que fica há 15 minutos do perímetro urbano de Tabatinga. É preciso deixar o carro e seguir a pé sobre uma estreita ponte de tábuas para entrar na aldeia, que é asfaltada e tem energia elétrica. As casas de madeira e alvenaria substituiem as malocas, mostrando que nem sempre os índios vivem da maneira que os livros os retratam.

Os Ticunas não foram pegos de surpresa com a nossa visita. “Antes, o capitão avisou pela ‘boca-de-ferro’”, como eles chamam os megafones que ficam no alto de um poste, contou um dos índios da aldeia. Parte dos moradores foram reunidos na sede da Igreja Evangélica, uma das três que há na aldeia, para apresentar as equipes e explicar o que aqueles “homens brancos” estavam fazendo ali.

David, representante da Funai na região, foi o nosso mestre de cerimônias. Fez as devidas apresentações para uma comunidade curiosa com a vinda dos estrangeiros e para os rondonistas que estavam embevecidos com a atmosfera, apesar do sol escaldante e do calor de mais de 40 graus, de molhar as roupas e deixar a pele vertendo água.

Os estudantes foram conhecer a aldeia, caminhando pelas suas ruas, acompanhados pelas mulheres, homens e, principalmente peas crianças, que soltavam gargalhadas gostosas toda vez que uma máquina fotográfica disparava em sua direção.

Tímidos, foram aos poucos conhecendo os estudantes. Os Ticunas ainda preservam a sua cultura, falam o idioma ticuna e o português. Ambos são ensinados na escola, porém só os maiores conseguem entender e falar o português fluentemente. Alguns também dominam o espanhol, já que a aldeia fica na fronteira com o Peru e a Colômbia.

Os estudantes de economia, artes, enfermagem, biologia, já procuraram dirigir o olhar para fazer uma análise inicial da comunidade. Os Ticunas daquela aldeia não recebem programas sociais como o bolsa-escola, não têm um sistema de tratamento de lixo, não têm mecanismos para comercializar as bolsas, tapetes e redes que trançam e tingem com as fibras e as tintas naturais da região. No dia anterior de nossa visita 10 moradores foram diagnosticados com Malária.

No caminhão do exército, já no caminho da volta, o debate intenso entre os rondonistas mostrava que apesar de rápida a primeira visita já tinha dado muitos elementos para o trabalho que está apenas começando.

Publicado em 20/01/2005 no Estudantenet

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