Primeiro achei que podia ter lido errado. Reli e não pude acreditar na capacidade dos conservadores em produzir e reproduzir, a cada novo dia, novas teses para manter e ampliar o preconceito. Pior, para impedir a ascensão social de um segmento tão penalizado pelas políticas de uma sociedade dirigida pelos ‘brancos de olhos azuis’, como diria o presidente.
Pois é, o DEM – cujo apelido certeiro de demo vai se justificando cada vez mais – defendeu nesta quarta-feira, durante a audiência pública do Supremo Tribunal Federal realizada para debater o sistema de cotas raciais na universidade, que a culpa da escravidão é dos negros.
Demóstenes Torres, senador do DEM por Goiás, diz que o sistema escravista só existiu porque “a África subsaariana forneceu escravos para o mundo antigo, para o mundo islâmico, para a Europa e para a América”. Intercalou em seu raciocínio um comovido “lamentavelmente”, para completar afirmando que eles “não deveriam ter chegado aqui na condição de escravos, mas chegaram”.
Ora, vejam vocês a que nível de perfidez chega a mente humana. Uma vez, um amigo me disse que o homem é capaz de elaborar as mais complexas teses para justificar suas atitudes, não importa elas quais sejam. Olha aí!
O raciocínio de Demóstenes tentar validar a sua atitude preconceituosa, dizendo que a culpa da escravidão é dos negros, o homem branco nenhuma responsabilidade tem nisso e, portanto, reza a lógica cartesiana que não há motivos para se criarem políticas públicas de reparação social para tirar todo um povo da condição socioeconômica que a história lhes legou.
Se chegaram aqui como escravos, saídos de lá nesta condição ou não, isso não exime o Estado brasileiro da responsabilidade pela marginalização e pela violência cometida contra aqueles que chegavam aos milhares nos navios negreiros, seus filhos, netos, bisnetos e toda uma geração que continua sendo hostilizada porque não possuí a pela alva das elites.
O julgamento da inconstitucionalidade das cotas, movido a partir de ação do DEM, alega que as cotas para negros e afrodescendentes para ingresso no ensino superior fere o princípio da igualdade.
Que igualdade, cara-pálida? A social, que divide as pessoas entre as que moram nos edifícios de luxo e são na sua grande maioria brancas, e as que vivem nas favelas em condições sociais sofríveis e são na sua maioria negros e descendentes de negros? Ah! talvez ele esteja se referindo a igualdade na formação educacional, que as crianças e jovens recebem nas escolas para se prepararem antes de entrar na universidade. Certo. Ai há também muita igualdade de condições, já que os ricos estudam em escolas de elite com professores escolhidos à dedo e ensino de alta qualidade, contra a educação oferecida aos pobres, em escolas públicas abandonadas pelo Estado, sem infraestrutura básica, como cadeiras nas salas de aula.
É gente, há mesmo muita igualdade de condições para se chegar à universidade. Desculpe senador, só não vê quem quer.
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