Domingo, 10hs da manhã. Tomo o café da manhã lendo a Folha
de S. Paulo – o impresso. Nesta edição, o destaque é para a estreia da Folha na
TV. Um espaço alugado, emprestado, compartilhado no horário mais nobre do
domingo na programação da TV Cultura – emissora pública do Estado de São Paulo.
Ou, infelizmente, não tão pública.
18 horas. Voltando do almoço dominical na casa da sogra,
enfrento uma chuva torrencial na estrada. Quero chegar antes das 20 horas,
curiosa para assistir ao programa do jornal – afinal, ossos do ofício. Quando
me aproximo, uma árvore caída na rua, uns 50 metros antes da minha
casa, impede a passagem. Não há luz. Fui acolhida por uma vizinha e aguardei a
retirada dos troncos para terminar a noite à luz de velas.
Então, o programa de TV do jornal impresso eu assisti pela
manhã, na internet. Convergência de mídias é isso ai. Tivesse eu uma assinatura
3G poderia assistir no celular, ou no tablet (se eu tivesse um). Enquanto não há
regulamentação dos artigos constitucionais que tratam da comunicação social é
isso que temos – jornal e revista na TV, TV dona do jornal, locação de horário
em emissoras que são concessões públicas... mas isso é outra história. Voltemos
à Folha na TV.
Formato de web na TV
O TV Folha começou já há algum tempo como espaço audiovisual
de notícias veiculado no Folha.com. Com formato dinâmico e reportagens que tinham
um tratamento editorial mais focado na denúncia, mesmo quando se tratava de ações
do governo paulista. Na televisão, o TV Folha manteve a mesma dinâmica e
formato editorial.
O tratamento de imagens é mais arrojado do que o visto no
telejornalismo consagrado pelo padrão Globo. A câmera participa da reportagem
como personagem e não apenas como instrumento para captar a realidade. A
velocidade, os desfoques e um enquadramento mais livre para usar a imagem
editorialmente. Os infograficos, uma especialidade do jornal impresso, também
foi bem integrado à linguagem audiovisual, sem aquele formato careta.
Esteticamente, um produto muito bem realizado.
Mostrar prestígio e isenção
Em três blocos, o TV Folha foi ao ar nesta primeira edição
para impactar o público mostrando que tem prestígio e isenção. No primeiro bloco, uma reportagem
sobre a invasão na cracolândia trouxe depoimento do governador Geraldo Alckmin.
Em seguida, veio o prefeito Gilberto Kassab para falar da cidade de São Paulo e
da avaliação da sua gestão.
A primeira reportagem sobre um tema já exauridamente tratado
pelo noticiário desde janeiro, teve o tom de análise da ação da PM paulista no
centro da cidade para “limpar” a região dos usuários do crack. O ponto de
partida da análise foi discutir se a iniciativa do governo, em parceria com a
prefeitura, foi motivada pelas eleições 2012. Com depoimentos contra e a favor
da ação, e ancorado pelas pesquisas do Datafolha, a reportagem tentou passar
neutralidade no tratamento do fato, mas ao final ficou a mensagem de que a ação
da PM cumpriu o objetivo de tirar os “viciados” como disse o repórter, Fernando
Canzian, do centro paulistano.
Que vergonha da Bárbara
A tentativa de transformar a Bárbara Gancia no Márcio Canuto
da TV Folha foi de uma vergonha alheia total. Fiquei constrangida ao ver a
colunista de socialiates batucando um Kassab caçamba numa garrafa vazia de whisky.
Com tiradinhas como cachepô dos infernos, ela tentou fazer a denúncia das
caçambas sem fiscalização que ficam nas ruas da cidade. Gancho para uma entrevista com o prefeito, na qual os jornalistas Fernando Canzian e Vera Magalhães fizeram perguntas para tentar colocar o prefeito contra a parede. Jornalismo isento.
Puxão de orelha no Chico, que deselegância
No bloco Ilustrada, a TV Folha pegou carona do show do Chico
Buarque em São Paulo
da forma mais deselegante possível. O jornalista Ivan Finotti diz que o show é ótimo
porque o cantor relembra vários sucessos. Mas, para ele, há um porém: o Chico
canta 10 músicas do disco novo que ninguém quer ouvir????, diz o repórter. E para
fechar a deselegância com chave de ouro, ele ainda dá um puxão de orelha no
Chico dizendo – Chico podia ter sido só 5 vai! Sem comentários.
Como você já pôde perceber até aqui, as editorias do jornal
impresso ganharam endereço também na versão para TV. No TV Folha Mundo, o
programa trouxe uma reportagem sobre o a situação das regiões japonesas
atingidas há um ano pelo Tsunami.
No TV Folha Poder, o jornalista Fernando Rodrigues ganhou
uma coluna e no TV Folha Mercado o agraciado foi Vinícius Torres que pelo visto
vão dar voz ao pensamento anti-Dilma encastelado no jornal.
Já o Cotidiano na TV trouxe reportagem sobre a reintegração
de posse do Pinheirinho com entrevista exclusiva de Naji Nahas. Incrivelmente o
jornal para TV dos Frias transformou o caso de São José dos Campos como uma ação
de Nahas. O papel do governo paulista no episódio foi omitido escandalosamente.
Propaganda do jornal e do jornalismo Folha
Entre uma e outra reportagem, o TV Folha faz propaganda do
jornal impresso, mostrando o trabalho na redação, o edifício, o jornal na
prensa tentando passar a mensagem de um jornalismo que vai às ruas, aos fatos,
apura e tem responsabilidade com a notícia. Esse “trabalho” não pode ser
mostrado no impresso. Mas as imagens falam mais que mil palavras.
Num momento em que a credibilidade da Folha vem sendo
questionada por amplos setores, em que fica visível nas linhas do jornal o tom
oposicionista ao governo Dilma e o atrelamento do veículo ao projeto político
dos tucanos, ter um produto audiovisual que procure desmontar essa crítica é
estratégico.
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