A tática de despertar o pânico fazendo ilações sobre supostas tentativas de cerceamento da democracia tem sido frequentemente utilizada pela oposição conservadora no país. E isso, não é de hoje.
Em 1989, ano que marca a primeira disputa presidencial após o regime militar, me lembro bem de ouvir as pessoas dizendo que se o Lula ganhasse as eleições, ele iria desapropriar todas as propriedades, as pessoas teriam que sair de suas casas, dividi-las com outras famílias e toda a sorte de bobagens que se pode imaginar.
Eu tenho medo
Em 2003, diante da inevitável derrota tucana nas eleições presidenciais, foi a vez do apelo emocional ao medo, protagonizado por ninguém menos do que a atriz namoradinha do Brasil, Regina Duarte. Em tom solene, ela ocupou o horário eleitoral para dizer que tinha medo do que poderia acontecer com o Brasil caso Lula ganhasse as eleições.
A tática do medo, que está sendo usada no momento, ressuscita o fantasma da censura e é uma ofensiva dos conglomerados de mídia e da oposição conservadora contra a crescente demanda por mais participação da sociedade nas políticas de comunicação.
O mantra da censura
O que faz a mídia hegemônica é repetir, tantas vezes quantas necessárias, o mantra de que o controle social sobre os meios de comunicação é censura. Bateram tantas e tantas vezes na tecla de que censura e controle são a mesma coisa que, inclusive setores que defendem mecanismos de participação da sociedade sobre os meios de comunicação já estão questionando se esta deve ser ou não uma bandeira a ser desfraldada.
Se setores da sociedade se mobilizam para definir critérios para exibição de conteúdos de acordo com horário e faixa etária – a classificação indicativa – os veículos tacham: é censura. Se há iniciativas que criam regras para a publicidade de medicamentos, bebidas ou para propagandas voltadas ao público infantil, os veículos tacham: é censura. Se segmentos organizados definem parâmetros para que se respeitem os direitos humanos nas atividades de comunicação e entretenimento, os veículos tacham: é censura.
Liberdade de empresa
As empresas de comunicação – a economia da informação e do entretenimento, que é um negócio para lá de lucrativo – não viraram os guardiões da liberdade de expressão. Pelo contrário, não estão fazendo nada além do que defender a liberdade de empresa – deles.
Senão, veríamos nas emissoras de televisão, por exemplo, reportagens nos quais os movimentos sociais não são arruaceiros e criminosos, haveria espaço na cobertura jornalística para o exercício do contraditório, a produção independente e regional teria abrigo nos canais de televisão.
Esses veículos temem – por isso usam a tática do medo – que seu modelo de negócios seja ameaçado. E, como estão cada vez mais assumindo para si o papel de partido político da elite conservadora no país, atuando ostensivamente no jogo político para derrotar o atual governo e os setores progressistas da sociedade, rechaçam todo o tipo de discussão e iniciativa que possa inviabilizar que esse papel ideológico seja cumprido.
O engodo do controle remoto
Na sociedade que consagrou o indivíduo como o centro de todas as coisas, a neoliberal, a alternativa oferecida pelos veículos de comunicação aos que estão descontentes com o conteúdo do que está sendo oferecido é o livre-arbítrio: não gostou, não leia, não assista, não ouça.
As empresas de comunicação se eximem da responsabilidade do que é produzido e veiculado e a repassa para o leitor, o telespectador. Vejam, afinal, para que serve o controle remoto? Vou responder: serve para dar ao telespectador a sensação de que ele detém o poder sobre a programação. Nada mais.
Se uma emissora de televisão aberta é uma concessão pública, o pressuposto de – não gosta não assiste – está com o sinal trocado. Afinal, ao receber a outorga para explorar um canal de televisão, aquela empresa deveria respeitar os preceitos constitucionais, a dignidade humana, os interesses da sociedade.
Comunicação é ouvir, não só falar
Ah!, alguém pode dizer: “mas a sociedade tem interesse no Big Brother Brasil, ou na Fazenda ou em programas que imbecilizam e humilham as pessoas e degradam as relações humanas”. Será? Então porque a audiência de mini-séries tem batido sucessivos recordes enquanto estes programas tipo reality shows têm visto seus seguidores despencar?
É verdade que estes programas têm um público, seja pelo apelo destes ou pela falta de opção. Mas isso justifica a sua exibição? Formar audiências para conteúdos de qualidade também é uma função desses meios. Podem ter certeza que, se anunciado o final destes programas não haverá uma manifestação em frente às emissoras em protesto.
Criar uma confusão entre o que é censura e controle é de interesse dos meios de comunicação. A sociedade tem sim o direito de opinar sobre o conteúdo de uma programação, de expor seu ponto de vista e isso não significa cerceamento nenhum à liberdade de expressão.
E, a noção deste direito, está se ampliando. Por isso a ofensiva e a tentativa de imputar à sociedade o rótulo de censores.
Em tempo:
Por ocasião da apresentação do PL (6446/09) que proíbe as emissoras de rádio e televisão de exibirem situações humilhantes e degradantes em reality shows, o site da Câmara dos Deputados colocou uma enquete para saber a opinião dos internautas.
Quando eu votei, a favor do projeto, o resultado da aferição estava apertada – 51% a favor do projeto e 49% contra.
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