Pode até não parecer, mas há um quê de filosofia embutida nesta pergunta aparentemente simples. Qual o limite da opinião, qual o futuro da humanidade na era da cibercomunicação, são questões para as quais ainda não se tem respostas – talvez nunca tenham.
Mas, para além da filosofia, há um debate político
importante para ser enfrentado sobre o assunto, que foi alvo de uma audiênciapública na Câmara dos Deputados, na tarde de ontem. Para debater a judicialização
da censura, a Comissão de Direitos Humanos reuniu o professor Túlio Viana, o
deputado federal Emiliano José (PT-BA) e esta blogueira.
O debate foi interessante mas, apenas tangenciou a discussão
acerca do tema proposto, já que avançou para outras questões relativas a
democratização da comunicação – o que mostra que, mais do que nunca, este é um
tema que está na ordem do dia.
Então, aproveito para apresentar algumas considerações sobre
a questão: Por que são processados os blogueiros? Filosofias e casos isolados à
parte, os blogueiros são processados porque estão no epicentro de uma disputa
pelo poder.
Quem é o mediador?
Até bem pouco tempo atrás, os meios de comunicação
hegemônicos – rádio, televisão, grandes jornais e revistas – detinham o
monopólio da mediação da esfera pública, o que lhes conferiu um alto grau de
poder político e econômico. Alguns passaram a chamar a mídia de 4º poder, mas o
apelido que pegou nos últimos tempos foi PIG – Partido da Imprensa Golpista.
O fato é que o surgimento das novas tecnologias da
comunicação abalou, ainda que não se saiba medir em que grau, esse monopólio. A
internet e sua arquitetura aberta, descentralizada e colaborativa permitiu o
nascimento de milhares de novos atores sociais com a capacidade de produzir
informação e opinião, criando o que até então não havia – o contraponto.
Blogs, microblogs, redes sociais e portais não vinculados à
velha mídia deram voz aos que estavam calados e quebrou o monopólio da fala que
estava concentrado numa elite política e econômica. E, isto, é disputa de
poder.
Essa elite e seus veículos de comunicação não aceitam perder
nem um naco do poder que lhes era exclusivo e estão utilizando de todos os
expedientes para calar a “concorrência”.
Desqualificar e estrangular
A fórmula que estão usando é simples: desqualificação + estrangulamento econômico. No primeiro caso tentam marcar os blogueiros e ativistas digitais com o carimbo da falta de credibilidade e compromisso com a informação. Um emblema disso foi a campanha do site do Estadão produzindo pela agência Talent. Onde um macaco chamado de Bruno tinha um blog que servia como fonte para o trabalho de um estudante de economia. O comercial deu o que falar na época e foi tirado do ar.
A fórmula que estão usando é simples: desqualificação + estrangulamento econômico. No primeiro caso tentam marcar os blogueiros e ativistas digitais com o carimbo da falta de credibilidade e compromisso com a informação. Um emblema disso foi a campanha do site do Estadão produzindo pela agência Talent. Onde um macaco chamado de Bruno tinha um blog que servia como fonte para o trabalho de um estudante de economia. O comercial deu o que falar na época e foi tirado do ar.
Outro emblema dessa desqualificação foi o sobrenome que Serra
deu aos blogueiros durante a campanha presidencial de 2010 – Sujos.
A outra via utilizada para tentar calar os blogueiros é a
judicial, uma enxurrada de processos civis e criminais contra blogueiros, com a
imposição de multas impagáveis tem pipocado em todo o país. São movidos, na
maioria dos casos, por coronéis da política, por jornalistas, empresas de
comunicação e pelo setor corporativo. Um dos casos que ganhou mais evidência
foi o do blog Falha de S.Paulo, dos irmãos Mário e Lino Bochini.
Esse expediente da judicialização da censura não é exclusivo
do Brasil. Nos Estados Unidos, em 2007, processos contra blogueiros
movimentaram 17,4 milhões de dólares.
Dois pesos e duas medidas
Há os que dizem que, apesar da necessidade de se garantir a liberdade de expressão, não se pode vendar os olhos para o fato de que muitos blogueiros publicam conteúdos discriminatórios (racistas, homofóbicos e nazistas), inventam fatos que comprometem a honra de pessoas e empresas.
Há os que dizem que, apesar da necessidade de se garantir a liberdade de expressão, não se pode vendar os olhos para o fato de que muitos blogueiros publicam conteúdos discriminatórios (racistas, homofóbicos e nazistas), inventam fatos que comprometem a honra de pessoas e empresas.
Bem, isso pode até ser verdade, mas não é o retrato da
realidade da judicialização da censura. A maioria dos blogueiros não tem sido
processada por veicular conteúdos criminosos, mas sim por estarem revelando
informações que não eram divulgadas pela mídia hegemônica e, principalmente,
por emitirem opinião e versão diversa dos pseudo-fatos publicados pela velha
mídia.
Muito pelo contrário. Quem tem publicado conteúdos
discriminatórios e que comprometem a honra das pessoas é a velha mídia. E o
pior, o faz livremente. Emissoras de televisão, jornalões e revistas têm o
direito de dizer o que quiser, sem revelar suas fontes, sem que qualquer
apuração e fatos que sustentem suas notícias sejam apresentados à sociedade,
infringindo a Constituição Federal que diz que o ônus da prova é de quem acusa.
Bem, mas essa velha mídia pode ser processada. Eu diria,
poder até pode, mas o estrago que uma manchete de jornal ou uma notícia
veiculada no jornal nacional provoca não tem processo que repare.
Um ambiente de direitos e não de proibição
A tentativa de cercear a liberdade de expressão da sociedade para que os velhos impérios midiáticos mantenham sua liberdade de empresa e o monopólio de mediação da esfera pública se dá pela judicialização da censura e pela articulação para que se aprovem leis restritivas para a internet, como no caso do AI 5 digital do senador Azeredo.
A tentativa de cercear a liberdade de expressão da sociedade para que os velhos impérios midiáticos mantenham sua liberdade de empresa e o monopólio de mediação da esfera pública se dá pela judicialização da censura e pela articulação para que se aprovem leis restritivas para a internet, como no caso do AI 5 digital do senador Azeredo.
O debate sobre a internet não pode se dar a partir do que
deve ser proibido e evitado na rede, mas sim dos direitos e liberdades que ela
precisa garantir. Por isso é urgente a aprovação do Marco Civil da Internet e a
discussão de um novo marco regulatório para as comunicações.
Compreender a fundo as transformações no ambiente da
comunicação e na sociedade que a internet e as novas mídias estão produzindo é
um desafio. Mas só o seu potencial mobilizador e questionador já são suficientes
para incomodar os bastiões do status quo. Por isso, estão sendo processados os
blogueiros.
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